Comer, beber, viver
Tomio Kikuchi, pensador macrobiótico
Ele pode ser chamado de pai brasileiro da macrobiótica. E muito mais do que ensinar a fazer pratos coloridos e balanceados, Tomio Kikuchi, 84 anos, tem o objetivo de tratar seres humanos por dentro e por fora. De um jeito simpático, num português enrolado e em meio aos saltos e agachamentos que comprovam a boa forma, o japonês de nascimento e brasileiro por escolha fala de comida, casamento, política e jura – de pés juntos – que, se você realmente estiver disposto, apenas três dias bastam para transformar a sua vida da água para o vinho. Ele recebeu o Viver Bem para uma entrevista durante uma de suas visitas a Curitiba para divulgar a sua Autoeducação Vitalícia.
O que diferencia a macrobiótica de outros regimes alimentares?
A macrobiótica engloba a alimentação mental, verbal, psicossomática e nutricional. É preciso se alimentar com sabedoria. O que entra pela boca é só o começo. As pessoas se alimentam mais com o que é desejável do que com o que é necessário. Se voltarmos para nosso interior e observarmos nosso instinto, vamos saber o que é indispensável. É isso que a macrobiótica prega.
Então, estamos falando na adoção de um estilo de vida mais saudável e consciente?
Sim, mas este estilo de vida não compreende só alimentação e exercícios físicos. Suas atitudes têm reflexos que impactam na vida inteira. As pessoas são condicionadas a fazer sempre o mesmo. Mas é importante ter dúvidas, perseguir as razões das coisas, a origem dos dramas. Você aprende com o que viveu e deveria aprender também com os erros. Se um dia você come uma coisa que faz mal, não deveria repetir a experiência. Mas você repete uma, duas, três vezes, reclama, adoece e continua fazendo errado. É assim na alimentação e é assim na vida.
Se tudo começa pela boca, o que devemos comer para sermos saudáveis?
A matéria-prima do sangue entra pela boca. O sangue trabalha 24 horas sem parar, renovando nossas células e nossos órgãos. Por isso, quando perdemos a normalidade, a regularidade e a imunidade do sangue, ficamos doentes. E o segredo do controle do sangue é a alimentação. Quem não sabe viver pela boca, vai morrer pela boca. Precisamos de alimentos variados para atender todos os sistemas do corpo.
É uma eterna busca pelo equilíbrio?
Equilíbrio não existe. Tudo na vida é desequilibrado. É a eterna tentativa de segurar vários pratos, avaliar os ganhos e as perdas e ficar com o que, naquele momento, é melhor para você. O coração não é equilibrado, ele se ajusta conforme suas emoções, o compasso não segue sempre o mesmo ritmo. Desequilíbrio é vitalidade. A normalidade atrofia.
Que atitudes devemos tomar para viver melhor?
As pessoas estão sofrendo mais, estão mais doentes, mais estressadas, mais sozinhas, mais tristes. Só que estão esquecendo que o fim de todos é o mesmo. A única certeza é essa e que o que temos para viver é o agora. Precisamos comer bem agora, precisamos movimentar o corpo agora, precisamos parar de viver de fantasias agora, precisamos aprender com o passado e fazer planos agora.
Mas o que fazer quando se está mal, doente, triste?
A natureza é sábia, os estragos feitos não são imutáveis, é possível se recuperar. Mas é preciso querer. As pessoas em geral se preocupam com a aparência formal, com a cara e não com o coração. Mas o que vale mais, a cara ou o coração? A cara não fortalece o coração. Mas quando o coração está bem, a cara fica bem também. A personalidade é mais profunda e mais importante que o status, a carreira, a conta do banco, o rosto perfeito. Só que encontrar uma personalidade confiável, coerente, é mais difícil que uma carreira brilhante. A preocupação excessiva com dinheiro e imagem, a falta de tempo, o deixar de lado os afetos move essa roda de insegurança e violência que estamos vivendo.
O senhor faz palestras em favelas durante as viagens. Como é este contato com as comunidades carentes de todo o mundo?
Quem nasceu pobre e passa por dificuldades tem sorte por poder mudar. Quem nasceu com tudo pronto não tem o ímpeto da mudança. A necessidade e a dificuldade levam à transformação. Eu sou um jovem de 84 anos, o caçula de nove irmãos, que só se vestia depois das roupas terem passado pelos outros, que comia por último, que sempre ajudava. Só tenho a agradecer por isso. Foi o que me fez mais forte. É isso que eu tento mostrar para os outros. Passar por dificuldades é ter diante de você um leque de oportunidades. A tristeza, a dor, a privação de tudo fazem você aprender a viver. É um processo fortalecedor. Nas comunidades carentes, mostro a importância de alguns outros valores que eles têm em casa, como a solidariedade, a amizade, a alegria.
Serviço:
Centro de Autoeducação Vitalícia de Curitiba, fone (41) 3322-9597.
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